9 de set. de 2014

Negociata permitiu que Cerveró, ex-diretor da Petrobras, morasse, nos últimos cinco anos, em imóvel de R$ 7,5 mi comprado na mesma época da aquisição de Pasadena

BRASIL - Corrupção
Negociata permitiu que Nestor Cerveró, ex Petrobras, morasse, nos últimos cinco anos, em imóvel de R$ 7,5 mi comprado na mesma época da aquisição de Pasadena
Veja investigou a história do imóvel, ocupado por Nestor Cerveró, o ex-diretor internacional da Petrobras, enroscado no caso da compra da Refinaria de Pasadena, e se deparou com uma nebulosa história, que envolveu a abertura de uma empresa offshore no Uruguai, o uso de um laranja para representá-la no Brasil e a criação de uma sede-fantasma em uma cidade litorânea do Rio.

Foto: Evaristo Sá/AFP/VEJA

O ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró, foi autor do famoso “parecer falho”, favorável a compra da refinaria de Pasadena

Postado por Toinho de Passira
Reportagem de Thiago Prado
Fontes: Veja, Exame, Radar Online - Lauro Jardim,

O ex-diretor internacional da Petrobras Nestor Cerveró tem se revelado um especialista cm omissões. Em 2006, apresentou ao conselho de administração da empresa um resumo referente à compra da refinaria de Pasadena, nos EUA, sem as cláusulas que beneficiavam a Astra Oil, a sócia belga no negócio. No mesmo período em que se arrastaram a bilionária compra e o posterior litígio entre a Petrobras e sua sócia, Cerveró trabalhou também para não dar transparência a outra transação — desta vez imobiliária.

VEJA teve acesso a documentos que detalham a compra de um apartamento avaliado hoje em 7,5 milhões de reais na Zona Sul do Rio de Janeiro. Trata-se do local onde Cerveró e sua mulher moraram durante os últimos cinco anos. Não foi um negócio usual de aquisição de um imóvel. A transação envolveu a abertura de uma empresa offshore no Uruguai, o uso de um laranja para representá-la no Brasil e a criação de uma sede-fantasma em uma cidade litorânea do Rio de Janeiro. Todo esse aparato para a compra do apartamento ocorreu quase simultaneamente a uma série de gastos milionários da estatal com a transação de Pasadena e a contratação de escritórios de advocacia.

O nebuloso enredo tem início em 2008 com a abertura em Montevidéu da Jolmey Sociedad Anônima. Oficialmente, ela está em nome de um fundo de investimentos, representado pelo advogado uruguaio Oscar Rachetti. No dia 28 de agosto daquele ano, o advogado Marcelo Oliveira Mello recebeu uma procuração para representar e administrar a empresa no Brasil. Como Rachetti chegou a Mello? O advogado brasileiro afirma apenas que foi procurado por um escritório de advocacia uruguaio que representava investidores — e aceitou a tarefa.

Mello, numa das inúmeras coincidências dessa história, conhece Cerveró de longa data. Tem no currículo uma passagem pelo departamento jurídico da Braspetro, extinta subsidiária da Petrobras, mais tarde incorporada pela área internacional da estatal, na qual Cerveró deu as cartas entre 2003 e 2008.

Depois, foi sócio do escritório de advocacia Tauil, Chequer & Mello, que é parceiro do Thompson & Knight, responsável pela defesa da Petrobras em processos que envolvem Pasadena. Em 2008, a estatal chegou a gastar 7,9 milhões de dólares com a sua defesa no litígio com a Astra Oil. Após a contenda com os belgas, uma decisão judiciai obrigou a Petrobras a comprar os 50% da Astra. Foi justamente um pouco depois desse festival de gastos da estatal — mais exatamente em março de 2009 — que a Jolmey resolveu apostar no mercado imobiliário carioca.

A Jolmey comprou por 1,5 milhão de reais, de acordo com a escritura, um apartamento na Rua Nascimento Silva, em Ipanema — o imóvel é avaliado pela prefeitura do Rio de Janeiro em 7,5 milhões de reais. A escritura do apartamento foi pago pela empresa uruguaia Jolmey do Brasil Administração de Bens Ltda, de uma só vez o apartamento. Depois de um sinal de 250 000 reais, a offshore passou quatro cheques: um de 1,28 milhão de reais; e outros de 25 000 reais, 22 500 reais e 15 000 reais.

Três meses depois (olha a coincidência dando as caras de novo nesta história imobiliária), um contrato de locação assinado por Mello em nome da offshore foi firmado com Patrícia, a mulher de Cerveró.

Foi, segundo os envolvidos, um lance do acaso. Patrícia estava em busca de um apartamento, e a imobiliária ofertou justamente aquele de propriedade da Jolmey. "Repassei para a administradora encontrar alguém.

Foi coincidência a Patrícia alugar", afirma o advogado. O casal não se encantou à toa com o imóvel. De fato, era um belo apartamento. Por 3650 reais mensais, os dois passaram a usufruir um dúplex não muito distante da Praia de Ipanema com cerca de 300 metros quadrados e piscina.

Mello tem na ponta da língua uma justificativa para a compra do imóvel pela Jolmey:

"O objetivo era criar um portfólio de investimentos residenciais para executivos empresariais". O problema é que, desde 2008, a offshore fez um único investimento imobiliário no Brasil — justamente o apartamento ocupado pela família Cerveró.

Foto: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo & Reginaldo Teixeira/VEJA

Transação camuflada - O apartamento dúplex, com piscina, em que Cerveró morou nos últimos cinco anos em Ipanema foi comprado por uma empresa offshore representada por um advogado que trabalhou na estatal com o ex-diretor da Petrobras

Recentemente, o ex-diretor da área internacional da Petrobras e seus parceiros começaram uma operação para apagar, ou ao menos embaralhar, as digitais da Jolmey no Brasil. Há cinco meses, quando o escândalo de corrupção na estatal estava no auge, Mello fez uma alteração contratual na offshore. Desligou-se da sociedade e mudou a sede brasileira da empresa do Centro do Rio para a cidade de Saquarema. No endereço, está uma casa abandonada, onde nenhum proprietário foi visto recentemente, de acordo com afirmação dos vizinhos.

Ao dizer adeus à Jolmey, Mello entregou a sua cota a um certo Selson Ferreira. VEJA também localizou Ferreira. Ele trabalha como auxiliar administrativo em um escritório de contabilidade em Niterói. Nervoso, inicialmente negou que tivesse alguma participação na empresa.

Confrontado com documentos, pediu auxílio ao chefe, Armando Bento. Sua tentativa de explicação não fica de pé. Disse Bento: "O Marcelo (Mello) pediu e nós fizemos. Mas você deveria falar com ele. Te peço para não me procurar mais". Assim, não esclareceu por que um funcionário seu assumiu a representação de uma empresa uruguaia criada apenas para comprar o apartamento em que os Cerveró passaram a morar.

No mês passado, o ex-diretor internacional da Petrobras e sua mulher deixaram o apartamento da Rua Nascimento Silva. Edson Ribeiro, advogado de Cerveró, afirma que a mudança ocorreu porque seu cliente precisava economizar.

"Ele está com pouco dinheiro desde que saiu da Petrobras e deixou de receber salário de executivo", diz. Não foi o primeiro movimento de Cerveró para se desvincular do seu patrimônio. Em junho, buscando fugir do bloqueio de bens pedido pelo Tribunal de Contas da União (TCU), doou três apartamentos aos dois filhos.

Até o momento, o maior revés para os diretores que participaram da compra de Pasadena foi uma decisão tomada em julho pelo TCU. O tribunal condenou onze diretores da Petrobras a devolver 792 milhões de dólares por prejuízos causados pelo negócio. Cerveró é acusado de fazer um relatório falho e incompleto para o Conselho de Administração da Petrobras, ao qual cabia aprovar a compra da refinaria.

Foto: Folha do Sul

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Nesta próxima quarta-feira, 10, Cerveró falará a deputados e senadores na CPI mista da Petrobras. Será o terceiro depoimento dele ao Congresso sobre o caso Pasadena. Trata-se de uma excelente oportunidade para entender por que a compra do apartamento em que o ex-diretor internacional da Petrobras morou durante cinco anos teve de ser tão camuflada. Com a palavra, mais uma vez, Cerveró.

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