11 de nov. de 2013

Rose Noronha, suposta amante de Lula, quebra o silêncio: 'não fiz nada de errado'

BRASIL - Corrupção
Rose Noronha, suposta amante de Lula,
quebra o silêncio: 'não fiz nada de errado'
Em sua primeira entrevista depois da eclosão do escândalo, Rosemary Noronha, a ex-chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo, se diz perseguida e injustiçada por ser amiga do ex-presidente Lula

Foto:Jefferson Coppola/VEja

CORRUPÇÃO - "Nada mais natural do que encaminhar pedidos. Nunca recebi nada por isso"

Postado por Toinho de Passira
Texto de Adriano Ceolin
Fonte: Veja

Rosemary Noronha sabia desfrutar o poder quando era chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo. Amiga íntima do ex-presidente Lula. ela empregava parentes na administração, intermediava negócios milionários para amigos e familiares, hospedava-se em aposentos de luxo mundo afora e tinha um talento especial para ganhar cortesias — de diárias em resorts de luxo a ingressos para shows de artistas consagrados. Rose era cortejada por servidores graduados e empresários por um motivo bem simples: ela abria as portas dos gabinetes mais poderosos, inclusive o mais importante deles, no 3º andar do Palácio do Planalto. Desconhecida do grande público. Rose levava uma vida de rainha. Foi assim até novembro do ano passado, quando a Polícia Federal desbaratou uma quadrilha que defendia interesses privados no governo em troca de propina. Seis pessoas foram presas. Outras doze, indiciadas. Apontada como protagonista da teia criminosa que mercadejava pareceres de órgãos técnicos, Rose perdeu o emprego, a influência e o prumo. Caiu do pedestal e sumiu do mapa.

Na semana passada, um ano depois da ação da PF, Rose quebrou o silêncio a que tinha se submetido por orientação de advogados e petistas graúdos. Em conversa com VEJA. a poderosa de outrora, conhecida pela arrogância no trato com subordinados, se disse inocente e injustiçada. Apresentou-se ainda como vítima de trapaças de ex-companheiros e de insinuações maliciosas da imprensa. "Não fiz nada de errado. E tenho certeza disso. Sou inocente." Magra e com aparência bem cuidada. Rose conversou por quase uma hora com a reportagem, num shopping paulistano, sempre mantendo o olhar fixo no interlocutor. Firme na forma e frágil no conteúdo, rebateu as acusações de modo genérico. Mostrou-se também bastante magoada. Um dos motivos é a ligação com o ex-presidente Lula. Segundo Rose, os dois jamais tiveram uma relação de intimidade. "Minha relação com ele é de amizade, fidelidade, e totalmente profissional. As nossas famílias se conhecem desde que as crianças eram pequenas."

Questionada sobre quando e como conheceu o ex-presidente, Rose se irritou e pediu que todas as declarações fossem desconsideradas. Como é notório, ela costumava viajar com Lula quando a ex-primeira-dama Marisa Letícia não fazia pane da comitiva. Petistas e poderosos nunca fizeram questão de esconder esses laços. Pelo contrário, valiam-se deles a fim de levar suas demandas ao então mandatário. Educada na conversa, e às vezes até bem-humorada. Rose também se queixou das conclusões da PF ao analisar sua relação com o advogado Paulo Vieira, o ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) apontado como líder do grupo que vendia facilidades em órgãos federais. Segundo os investigadores, Vieira repassava parte da propina recebida à ex-chefe de gabinete da Presidência. Eles citaram, por exemplo, um repasse de 12 500 reais para ela. Rose diz que essa transação nada teve de clandestina. Amigo da família desde a década de 80. Vieira, como padrinho de casamento da filha de Rose, teria dado 5 000 reais para que fossem usados na compra de um sofá e de uma estante, presentes aos noivos. O restante teria sido investido numa cirurgia no ouvido.

Rose diz ter guardado as notas fiscais que comprovariam tais despesas. Amigo generoso, Vieira usava o nome da então chefe do escritório presidencial como trunfo principal para traficar influência. Rose afirma que não sabia disso e alega que só caiu na rede da Polícia Federal porque trocou um telefonema com Vieira quando ele já estava sendo monitorado. "Sempre tive a maior consideração por ele (Vieira). Como se ele fosse meu irmão. Não entendi até agora o que aconteceu." O Ministério Público já entendeu. No fim do ano passado, denunciou 24 integrantes da máfia dos pareceres. Rose responderá por falsidade ideológica, tráfico de influência, corrupção passiva e formação de quadrilha. "Eu era a chefe do escritório da Presidência. Nada mais natural do que encaminhar pedidos. Nunca recebi nada por isso." Essa defesa pode prosperar na esfera judicial. Na seara administrativa, Rose já foi condenada. Em setembro, ela foi banida do serviço público pela Controladoria-Geral da União (CGU). Rose alega que teve o direito de defesa cerceado nesse processo administrativo. Argumenta, por exemplo, que suas testemunhas nem sequer foram ouvidas.

Caso de Gilberto Carvalho, ex-chefe de gabinete de Lula e atual ministro da Secretaria-Geral da Presidência. Conforme VEJA revelou, subordinados do ministro tentaram melar a investigação realizada pela Casa Civil. Em documento oficial, esses funcionários chegaram a dizer que o trabalho da Casa Civil era ilegal e, por isso. deveria ser anulado. Por ordem da presidente Dilma Rousseff, a peça da tropa de Carvalho foi desconsiderada. Os advogados de Rose, porém, esperam usá-la nos embates que virão pela frente. O relatório produzido pela Casa Civil serviu de base para o banimento de Rose determinado pela CGU. A investigação relata, por exemplo, que Rose se hospedou, em 2010, no Palazzo Pamphili, sede da embaixada brasileira em Roma, na Itália. A estada dela no local, conforme a sindicância, configurou um caso de apropriação particular do patrimônio público. "O embaixador podia convidar quem ele quisesse para se hospedar lá. Ele me convidou porque éramos amigos", disse, referindo-se a José Viegas, que foi ministro da Defesa no governo Lula.

No início do ano, sentindo-se abandonada pelos ex-companheiros, Rose chegou a considerar a hipótese de revelar detalhes do que testemunhara durante os anos de governo. O socorro não tardou. Profunda conhecedora dos bastidores do poder, ela agora não faz ameaças nem promete revelações bombásticas. Reza, ao menos por enquanto, pela mesma cartilha de outros figurões da república petista, que apostam no silêncio como fonte de sobrevivência. Além de lhe garantir a solidariedade necessária. inclusive para custear o milionário time de advogados que cuida do seu caso, essa postura discreta tem uma motivação de cunho político pessoal. Rose não nutre a menor simpatia por Dilma. Ela não esconde que quer mesmo é a volta de Lula ao Planalto. Tudo em nome dos velhos e bons tempos.

Foto:
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