8 de nov. de 2013

A quem pertence as valiosas obras de artes, roubadas pelos nazistas e encontradas agora na Alemanha?

ALEMANHA
A quem pertence as valiosas obras de artes, roubadas pelos nazistas e encontradas agora na Alemanha?
Alemanha se prepara para batalha judicial sobre a propriedade das obras de artes roubadas durante o regime nazista. A coleção de cerca de 1.400 quadros, encontrados num apartamento, podem valer um bilhão de dólares

Foto: Associated Press

De Max Liebermann, a tela "Dois cavaleiros na praia" avaliada em 15 milhões de dólares

Postado por Toinho de Passira
Fontes: Opera Mundi, Wall Street Journal, The Daily Mail, BBC Brasil, Focus

Após a surpresa provocada pelo anúncio da recuperação de cerca de 1.400 obras de arte que teriam sido roubadas ou confiscadas pelo regime nazista, a Justiça alemã começa a se deparar com o problema que deve ser a devolução dessas obras aos herdeiros legítimos. Nesta quarta-feira (06/11), o Departamento de Estado dos EUA pediu à Alemanha que conduza o processo de devolução das obras com “transparência”, de acordo com o Wall Street Journal.

O pedido veio após consultas feitas com especialistas em direito de propriedade, advertindo que as leis alemãs nesse setor são muito rígidas e podem dificultar uma eventual restituição. Há mesmo a possibilidade de elas serem devolvidas a Cornelius Gurlitt, proprietário do apartamento onde elas foram encontradas, que atualmente se encontra desaparecido.

O acervo encontrado está avaliado em cerca de US$ 1,35 bilhão (R$ 3 bilhões) e, após o levantamento, constatou-se que muitas das obras eram até então desconhecidas. O caso foi revelado no último domingo (03/11) pela revista Focus, mas já estava sendo investigado pela polícia desde 2011. Entre o material se encontram trabalhos de Pablo Picasso, Henri Matisse, Phillippe-Auguste Renoir, entre outros, incluindo uma série de pintores judeus. Todos os quadros eram considerados "subversivos" à época do nazismo e, portanto, proibidos.

Agora que foram recuperadas, essas obras deverão provocar uma verdadeira corrida aos tribunais em grande escala por pessoas que aleguem ser os herdeiros de direito desses trabalhos. Artistas como o cubista espanhol Picasso chegam a ter seus quadros avaliados em 220 milhões de reais. Matisse atingiu quase metade do preço.

Foto: Associated Press

Os historiadores de arte estão empolgados com a descoberta dessa desconhecida pintura de Matisse, retratando uma jovem mulher

O CASO

O espólio foi encontrado, no início de 2011, no apartamento do octogenário Cornelius Gurlitt.

Cornelius herdou as obras do pai, Hildebrand Gurlitt, um colecionador de arte inicialmente ameaçado pelos nazis por ter uma avó judia, mas que, mais tarde, se tornou indispensável ao regime por seus conhecimentos artísticos. Chegou a ser encarregado por Joseph Goebbels, ministro da propaganda, de vender exemplares “de arte degenerada” expostos em museus alemães, para outros países.

A maioria dessas foi obtidas pelos nazistas através de saques e roubos nas casas de famílias de judias. Houve casos até de subornos propostos por oficiais nazistas para que negociadores de arte judeus (que controlavam a maior parte do comércio de arte na época) conseguissem transporte de maneira segura para escapar dos massacres, em geral para destinos como Reino Unido.

Já Cornelius mantinha os trabalhos guardados em um apartamento sombrio e sujo, e sobrevivia com a venda ocasional de quadros. Ele foi flagrado viajando em um trem da Suíça à Alemanha com uma quantia de € 9.000 em espécie em 2011 (quando o limite permitido é de € 1.000). Como nunca trabalhou nem tinha declarado fonte de renda, a polícia fez uma busca em seu apartamento e, por acaso, descobriu os quadros.

Segundo a revista Focus, Hildebrandt teria dito ao final da guerra que o acervo foi destruído nos bombardeios das tropas aliadas contra a cidade alemã de Dresden, em 1945.

Já o jornal alemão Süddeutsche afirmou que ele teve suas obras confiscadas pelos Aliados em 1945 e, após uma série de inquéritos, as teve devolvidas em 1950.

Foto: Associated Press

Outra pintura de Henry Matisse, "Mulher Sentada" - uma das obras desconhecidas, deve valer mais 100 milhões de dólares

ARTE DEGENERADA

Todas essas obras, no entanto, têm uma característica em comum: eram classificadas pelo regime nazista como “arte degenerada”, termo utilizado para caracterizar de forma pejorativa o modernismo, cubismo e surrealismo. Elas eram banidas e proibidas por não seguirem conceitos da natureza germânica, além de terem uma natureza “judaica-bolchevique”.

Foto: Stefan M. Prager?Daily Mail

Apartamento de Cornelius Gurlitt, onde cerca de 1.500 obras de arte foram encontradas

Muitos dos autores cujas obras foram encontradas, como Marc Chagall, Max Beckmann, Paul Klee, ou Max Liebermann, eram judeus e tiveram alguns de seus trabalhos expostos na famigerada exposição “Entartete Kunst” (ou “arte degenerada”, em alemão), em Munique, cujo real objetivo era ridicularizar as obras, em uma tentativa da propaganda nazista de mostrar “a perversão do espírito judaico na Alemanha”, insuflando ainda mais a opinião pública contra os judeus.

Foto: Wikimedia Commons

Goebbels visita a exibição "Arte Degenerada" em Munique

Outros artistas degenerados que tiveram suas obras recuperadas foram Pablo Picasso, Henri Matisse, Otto Dix, Pierre-Auguste Renoir, entre outros.

Foto:

Cena alegórica, pintura de Marc Chagall, valor estimado de R$ 15 milhões, nunca tinha sido vista pelo mundo da arte, antes de emergir da coleção de Gurlitt

BOM ESTADO

Na terça-feira (05), a Procuradoria-Geral de Augsburg, na Baviera, condeu uma conferência de imprensa onde reconheceu ainda não saber o paradeiro de Cornelius Gurlitt. “Não temos informações sobre onde ele se encontra”, disse o procurador Reinhard Nemetz. Também não explicaram porque demoraram quase dois anos para anunciar o achado. As obras estão estocadas em local não revelado.

“Quando estamos perante estas obras de arte que, durante muito tempo, foram dadas como desaparecidas ou destruídas, sentimos uma alegria incrível. Estão todas em relativo bom estado. Algumas estão sujas, mas não estão danificadas”, disse a historiadora de arte Meike Hoffmann, que participou da entrevista.

Foto:AFP/Getty Images

Reprodução de uma pintura do pintor italiano Canaletto, que poderia valer R$ 10 milhões

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