6 de jun. de 2013

As questões nebulosas na transferência de Neymar

BRASIL - Futebol
As questões nebulosas na transferência de Neymar*
Para o torcedor do Santos e para o torcedor que gosta também do futebol e não somente de seu clube do coração, fica uma questão: Neymar disputou o Mundial de Clubes em 2011 já com 10 milhões de euros do Barcelona em sua conta bancária? Sim, de acordo com as palavras do vice-presidente barcelonista. Sim, de acordo com o próprio balanço do clube

Foto: AFP

Sem grande exagero, podemos dizer que desde então, meados de 2011, Neymar tem jogado pelo Santos emprestado pelo Barcelona.

Postado por Toinho de Passira
Texto de Emerson Gonçalves, para o Globo Esporte
Fontes: Globo Esporte

A transferência de Neymar parece encerrada. O jogador já se apresentou, vestiu a camisa blaugrana, fez embaixadinhas, até falou algumas palavras em catalão. Já é ídolo. É provável que a essa altura já esteja registrado na UEFA.

Há um porém nessa história: justamente no momento em que transparência é a palavra de ordem buscada e sonhada por todos que gostam do futebol e em que a própria UEFA se empenha para que seja uma prática corrente, a negociação de Neymar deixa muitos pontos opacos, sem informações ou com informações pela metade. Começando pelo valor efetivamente pago a título de transferência, ou seja, o valor do direito econômico referente à transação.

Se reparten entre cuatro empresas y no lo podemos explicar...” – disse Josep Maria Bartomeu – primeiro vice-presidente do FC Barcelona, ao falar do valor a ser pago, contrariando a política de transferência tão defendida, na campanha eleitoral, por Sandro Rosell. Mas não é somente a partilha do dinheiro da transferência que falta ser explicada.

Para o torcedor do Santos e para o torcedor que gosta também do futebol e não somente de seu clube do coração, fica uma questão: Neymar disputou o Mundial de Clubes em 2011 já com 10 milhões de euros do Barcelona em sua conta bancária? Sim, de acordo com as palavras do vice-presidente barcelonista. Sim, de acordo com o próprio balanço do clube.

O Santos FC sabia desse acordo, que configura um contrato ou pré-contrato, explícita e claramente proibido pela FIFA?

A DIS (o fundo de investimento privado de futebol, ligado ao grupo Sonda) e a TEISA (o fundo financeiros criado para levantar fundos pro Santos), foram colocadas ao par desse contrato e desse pagamento?

Muricy Ramalho, treinador do clube, e seus companheiros de equipe sabiam desse fato?

Outra questão, ainda mais complicada, se coloca a partir dessas informações. Não mais existe o passe, é certo, mas existe um contrato entre jogador e clube. Esse contrato tem um valor monetário que pode ou não ser realizado. Se o atleta cumpre o contrato até o final nada há a ser realizado, ou seja, o valor que o clube tinha agregado pela presença e trabalho do atleta deixa de existir. Mas, e esse é um “mas” importante, durante a vigência do contrato o clube pode negociar a transferência do atleta e, dessa forma, realizar o valor monetário do contrato. Naturalmente, para que isso ocorra é necessário que haja a concordância do próprio atleta.

Em meados de 2011 o atleta Neymar tinha mais três anos inteiros de contrato com o Santos FC. Naquele momento ele já era o sonho de vários clubes, como o Chelsea (que tentara contratá-lo ainda em 2010), Real Madrid e, claro, o Barcelona. Nesse período, como foi relatado à época por esse OCE, informações levantadas por jornalista do jornal O Estado de S.Paulo davam conta de sua negociação com o Barcelona. Tudo foi enfaticamente negado, assim como já fora negado em relação ao Real Madrid. O torcedor santista, maior interessado em tudo isso, dormia tranquilo. Mal sabia ele, entretanto, que àquela altura um acordo já fora selado e dinheiro fora transferido, pelo que se depreende, novamente, das informações vindas da Espanha.

O contrato de Neymar interessava a três partes, legalmente: Santos FC, DIS e TEISA. Essas duas últimas partes tinham interesses – legais, plenamente legais e também legítimos – e valores monetários agregados ao contrato em vigor. Caso o atleta fosse negociado na vigência do contrato, teriam direito, respectivamente, a 40% e a 5% do valor. Repito: interesses tão legais quanto legítimos.

Esses interesses poderiam materializar-se em cima de um valor provável de 50 milhões de euros, que daria 20 desses milhões à DIS e 2,5 para a TEISA. Aqui é irrelevante se um lucraria muito ou não, pois, novamente, tratava-se de cumprir um contrato e quando se assina um contrato fica sempre implícita a boa fé de todas as partes envolvidas.

Agora, qual seria o interesse do atleta (e por atleta, aqui, entenda-se, também, seu pai e sua família) em ser negociado antes do final desse contrato em vigor, se ele já tinha 10 milhões de euros em caixa como pagamento inicial de futura transferência já sem o ônus do contrato em vigor? Mais que isso: segundo se depreende do balanço do Barcelona e das palavras atuais de seus dirigentes, essa seria somente a primeira parcela, outras viriam. Mais três ou, pelo menos, mais duas parcelas de 10 milhões de euros. Segundo o mais importante periódico espanhol, o El País, em sua edição eletrônica de segunda-feira, o pai do atleta teria 20 milhões de euros a receber como comissão. Muito dinheiro, seja aqui ou em Hong Kong, Paris ou New York.

Trocando em miúdos e falando em linguagem do dia a dia, a partir do momento em que Neymar e seu pai se comprometeram com outro clube e receberam por isso, deixaram de ter qualquer interesse na transferência para um outro clube que não fosse aquele com o qual já estavam acordados: o Barcelona.

Tudo que se seguiu desde meados de 2011 não passou, então, de uma farsa, no sentido teatral da palavra, uma comédia.

Comédia para uns, drama para outros. Para outros mais, uma dramédia, palavra dos novos tempos.

Sem grande exagero, podemos dizer que desde então Neymar tem jogado pelo Santos emprestado pelo Barcelona.

Não. Emprestado não é o termo certo, infelizmente. Não sei qual o termo correto, mas por tudo que já ouvimos e lemos, ele é jogador do FC Barcelona desde 2011, embora jogando por outro clube.

Por fim, mas não menos importante, fica outra questão: qual o valor pago ou a ser pago pelo Barcelona para o Santos? Valor sobre o qual o clube da Vila terá de repassar as partes correspondentes aos investidores.

Numa triste comédia de erros, Josep Maria Bartomeu, que agora já é nosso velho conhecido e primeiro vice-presidente (sempre é bom lembrar) do FC Barcelona, disse que o valor da transação é de 57 milhões de euros. Já o Santos FC, segundo a DIS, diz que só tem a receber meros 17 milhões de euros, o que implicaria grande perda financeira para os dois investidores. Ainda segundo o El País, segundo fontes próximas à negociação caberiam ao Santos 32 milhões de euros, além dos dois jogos e o acordo sobre jogadores da base. Falou-se em 28 milhões de euros no Brasil, durante a negociação, e, segundo a DIS, o valor informado pelo clube para cálculo de repasse foi de somente 17 milhões de euros.

Confuso? Com certeza.

Complicando um pouco mais esse quadro, em sua edição de hoje o diário esportivo Marca revela que a empresa DIS, segundo seu diretor executivo Roberto Moreno, está disposta a recorrer à FIFA, justamente em cima do reconhecimento do vice-presidente barcelonista dos 10 milhões de euros pagos ao atleta durante a vigência de seu contrato com o Santos. O que é, claramente, um assédio ilegal de acordo com a legislação da FIFA.

Como dito no final do post “Balaio de gatos milionário e uma volta a 2011”, essa história ainda vai render muitas histórias.
*Alteramos o título, acrescentamos subtítulo, foto e legenda a publicação original

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