16 de dez. de 2012

Filme pernambucano entre os 10 melhores da seleção do New York Times

BRASIL – Pernambuco- Cinema
Filme pernambucano entre os 10 melhores
da seleção do New York Times
'O Som ao Redor', do pernambucano Kleber Mendonça Filho, bate produções importantes com possibilidades de indicações ao Oscar, como 'Argo', de Ben Affleck, e 'Moonrise Kingdom', de Wes Anderson, na seleção do jornal americano, que diz que apresenta “25 favoritos de uma ano, quando 10 não são suficientes”. E nós estamos lá.


Detalhe da imagem do site do The New York Times mostrando foto do "O som em redor"

Postado por Toinho de Passira
Fontes: O Globo, The New York Times, Veja, Terra, O som ao redor - Site,

Longas bem cotados para o Oscar como Argo, de Ben Affleck, e Moonrise Kingdom, de Wes Anderson, perderam lugar para o brasileiro O Som ao Redor em uma seleção do site do jornal The New York Times.

Entre os dez melhores filmes do ano, a produção do pernambucano Kleber Mendonça Filho aparece em nono lugar.

Argo e Moonrise Kingdom recebem apenas "menções honrosas", junto com outros como Entre o Amor e a Paixão, de Sarah Polley, e A Escolha Perfeita, de Jason Moore, que acabam de estrear no Brasil.

A lista do NYT é encabeçada por Amour, coprodução entre Áustria, França e Alemanha dirigida por Michael Haneke. O filme é seguido por Lincoln, de Steven Spielberg, Indomável Sonhadora, de Benh Zeitlin, e Nota de Rodapé, de Joseph Cedar.

Na quinta e na sexta posições, vêm os premiados The Master, de Paul Thomas Anderson, e A Hora Mais Escura, longa de Kathryn Bigelow sobre a caçada a Osama bin Laden.

O novo Quentin Tarantino, Django Livre, aparece em sétimo lugar, à frente de Adeus, Primeiro Amor, de Mia Hansen-Løve, uma coprodução entre Alemanha e França. A lanterna fica com A Perseguição, longa de Joe Carnahan estrelado por Liam Neeson.

Uma das grandes produções nacionais dos últimos anos, O Som ao Redor é um filme que, ao se concentrar em uma rua de um bairro de classe média do Recife (Boa Viagem), fala sobre um país inteiro, suas relações sociais e a violência de seu cotidiano. Ali, nada parece anormal: crianças jogam bola, adolescentes dão seus primeiros beijos, o rádio de um carro é roubado... Clodoaldo (o ótimo Irandhir Santos) oferece seus serviços de segurança, que dão tranquilidade a alguns e provocam desconfiança em outros. Para atuar no cenário de O Som ao Redor, ele pede autorização ao “coronel da área”, o ex-senhor de engenho Francisco (W.J. Solha), proprietário de boa parte dos imóveis da região.

Kleber Mendonça Filho constrói a narrativa a partir de cenas aparentemente soltas, quase instantâneos de acontecimentos do dia a dia, e a partir delas tece um rico painel de imagens e de sons da vida da classe média brasileira, com seus medos e brigas de vizinhos. Tenso em muitos momentos, divertido em outros, é o trabalho de um diretor maduro, ainda que estreante em longa-metragens.

Foto: Divulgação

Cena do filme pernambucano O Som ao Redor

Entrevista de Kleber Mendonça na revista Veja:

O pernambucano Kleber Mendonça Filho é diretor de curta-metragens premiados, como Eletrodoméstica e Recife Frio, que estreiou como diretor de longa de ficção exatamente com o exitoso O Som ao Redor, que acabou exibido em festivais internacionais como Roterdã e Londres e premiado no Festival de Gramado com quatro Kikitos e no Rio com os troféus Redentor de filme e roteiro.

Foto: Bernardo Dantas/DP/D.A.Press

Kleber Mendonça, o premiado diretor pernambucano

Fonte: Veja

”O Som ao Redor foi construído a partir de observações pessoais do dia a dia. Como isso se transforma na vontade de fazer um filme?

Para mim, essas observações são naturais, transformá-las em imagens e em drama é o que me interessa pelo fato de muita coisa fazer parte de uma experiência de vida, a minha, a de amigos ou a de pessoas que conheço. Atualmente, não teria nenhum interesse em abordar temas que não domino, e que se passam em áreas sociais e culturais às quais não pertenço. Acho que não seria capaz de honrar esses temas e esses ambientes com o respeito que eles merecem.

Além de falar sobre os dias atuais, o filme relaciona o presente com o passado. Isso vem do fato de você ter uma mãe historiadora?


Minha mãe, Joselice Jucá, estudou uma ideia de reforma social no Brasil a partir do pensamento de André Rebouças, no final do século XIX. O Brasil aboliu a escravidão em 1888, mas preferiu não receber seus milhões de novos cidadãos (a população de cor negra e origem africana) na sociedade. Minha mãe, de maneira muito natural, e durante nossa infância e idade adulta, comentava tudo isso olhando para o presente, e mostrava como o presente podia ser explicado pelo passado. Para mim, o filme é isso, e é ela, que faleceu em 1995. O Som ao Redor é dedicado à minha mãe, Joselice.

A narrativa do filme é construída a partir de cenas do que de uma história clássica, linear. Por que essa escolha?


Isso tem sido muito discutido, mas, para mim, nunca foi realmente uma questão. O importante é manter a atenção de quem acompanha cada situação, sem aborrecer ninguém. Se tudo der certo, o filme irá relatar alguma coisa, será interessante. Desde o roteiro de O Som ao Redor que eu uso o termo “lógica da vida” para tentar descrever o que eu estava querendo fazer. Observamos acontecimentos à nossa frente sem informações sobre o que se passa, especialmente na rua. Cabe-nos olhar e tentar entender. É claro que é difícil transpor isso para um filme. Rende uma dor de cabeça grande na hora de fazer a sinopse. É aí que eu sinto falta de ter uma “história”.

O som tem um papel fundamental no filme, inclusive dando título a ele. Por quê?


Sons não respeitam as barreiras físicas impostas pelo homem, como muros, portas, cercas, divisões de espaço, as linhas que dividem a sociedade. O som é mal educado e entra em qualquer lugar. Sons também são prova de vida. Além disso, num país tropical e naturalmente barulhento como o Brasil, há um intercâmbio constante de sons entre as pessoas, lares e vizinhanças, para o bem e para o mal. Desde o roteiro, eu gostava da ideia de fortalecer a vontade de observar pessoas e aquele ambiente sem a ajuda dramática de uma trilha musical clássica, tipo “música romântica para momento romântico”, “música de suspense para momento de suspense”. Sem música, eu achei que deveria vir com uma contrapartida, que seriam sons, ambiência, um tapete sonoro para o filme. O filme tem música, mas sem notas musicais.

Como definiu a linguagem visual?


Também desde o roteiro, O Som ao Redor seria uma mistura de realismo social com uma linguagem “de cinema”. Ou seja, o filme se passa em lugares comuns, com gente comum, mas que seriam filmados em tela larga CinemaScope e ângulos clássicos, fixos, sem câmera na mão. Essa união do mundano com aspectos “fantásticos” me interessa muito, fortalece a ideia de “filme de cinema”. Isso talvez venha de filmes do cinema de gênero com os quais eu cresci, nos anos 1980, como Halloween, E.T., Um Lobisomem Americano em Londres, Gremlins, em que gente normal em lugares comuns é confrontada com elementos “do cinema”. Para mim, não há interesse nenhum em filmar uma cozinha comum como se fosse um documentário feito com uma câmera caseira tremendo.

A classe média ainda é pouco vista no cinema brasileiro, na sua opinião?


Se considerarmos a composição social dos que fazem cinema no Brasil (classe média, burguesa), sim, me parece pouco vista nos nossos dramas de cinema.

Esperava essa recepção tão boa ao filme?


Tem sido surpreendente. Fomos a Roterdã achando que O Som ao Redor seria um filme misterioso e local, talvez até paroquial, e o filme realmente decolou a partir de lá. Está em cartaz nos cinemas dos EUA, na Holanda, a reação da crítica tem sido excelente no exterior e também no Brasil. Espero que isso gere interesse no sentido de ser descoberto por um público brasileiro em janeiro, quando iremos lançá-lo.

O cinema pernambucano tem mostrado uma força incrível. Por que isso acontece, na sua opinião?


Por uma série de fatores de difícil explicação, e que talvez encontrem respostas num certo histórico de cultura que existe no Recife e em Pernambuco. Há um grupo forte de artistas em várias áreas da cultura, e uma delas é o cinema. Isso é muito bonito de se observar, e mais bonito ainda de ver os filmes e perceber que não existe neles uma preocupação de ser popular, de conquistar o mercado, mas apenas de fazer algo honesto. Isso é o que mais me impressiona nesse cenário, ainda mais pelo fato de esses filmes muitas vezes chegarem ao mercado e terem repercussão no Brasil e no exterior. É fantástico.


Trailer de O Som ao Redor


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