12 de set. de 2012

Apagonazo, por Yoani Sánchez - desde Cuba

CUBA - Opinião
Apagonazo
A blogueira cubana Yoani Sánchez comenta sobre o apagão monumental que aconteceu na ilha, no último domingo

Foto: Alejandro Ernesto / EFE

A Rua do Prado e do Capitólio de Havana (Cuba), domingo 9 de setembro, 23:00 horas

Postado por Toinho de Passira
Texto de Yoani Sánchez
Fontes: blog de Yoani Sánchez – Desde Cuba

Num país aonde os cortes elétricos tem sido parte de nossas vidas, já não deveríamos nos surpreender quando a luz se vai. Porém ontem, domingo, as 20:08 horas ocorreu algo que fez soar os alarmes. Primeiro perdemos o sinal de televisão, justamente nos primeiros minutos do noticiário do horário nobre. Depois Havana, em sua totalidade, apagou-se numa extensão e com uma magnitude que não recordávamos nem sequer durante os mais ferozes furacões. Começaram então a chegar informes de várias províncias confirmando que desde Pinar Del Rio até parte de Camagüey a Ilha havia ficado as escuras. Mais de 5 milhões de cubanos na penumbra se perguntavam o que acontecia.

Cinco horas depois o fluxo elétrico voltava ao bairro onde vivo. Aventurei-me a garatujar num papel algumas peculiaridades do ocorrido. Transcrevo-as aqui:

- O apagão elétrico foi acompanhado por um apagão informativo. Durante mais de quatro horas os meios oficiais não disseram nada sobre o que ocorria. Com rádios a pilha muitos de nós percorríamos o dial em busca de uma explicação, porém as emissoras nacionais guardavam silêncio. Rádio Relógio que minuto a minuto deveria ir dando os pormenores de acontecimentos nacionais e internacionais, falava de tudo menos sobre o mais importante. Desse modo tivemos que ouvir receita de medalhão de peixe, vantagens de se fazer uma mamografia, as belas lendas brasileiras sobre água… E o descobrimento de “sapatos “pré-históricos” em sítios arqueológicos. Tudo, menos o que queríamos saber: O que estava acontecendo que em metade do país não se podia ver nem as mãos?

-As pessoas começaram a se desesperar. As patrulhas policiais tocavam suas sirenes nas ruas e de vez em quando se escutava passar um carro de bombeiros. Caminhões com luzes de “estado de sítio” patrulhavam áreas do malecón. Isso aumentou o temor, que junto ao silêncio informativo gerou apreensão e muitas especulações.

-O incidente demonstrou a falta de previsão da Empresa Elétrica frente a tais situações. Muitos poucos lugares conseguiram ligar seus geradores e em bairros da periferia pediram aos próprios vizinhos que, se tivessem reservas de óleo, as levassem para fazer funcionar algumas destas unidades de geração.

-Causou especial mal estar o fato de que este apagão aconteceu num dia sem vento, sem que nenhum ciclone estivesse nos açoitando com sua chuva, nem uma tempestade solar havia se enfurecido especialmente contra a maior das Antillas. Qual foi então a causa de uma avaria de tais proporções?

-A rede social Twitter voltou a mostrar sua eficácia informativa. Uma hora depois da chegada da escuridão, na Internet já estavam os informes alternativos das dimensões geográficas desta. Levou pouco tempo para que tivéssemos inclusive uma etiqueta (tag) para definir a situação #Apagonazo. Enquanto os meios oficiais evidenciavam que só podem informar quando autorizados, os caminhos alternativos da notícia demonstravam sua importância não só na hora de denunciar um ultraje ou uma detenção, como também durante desastres naturais, perigos climatológicos e acidentes de qualquer tipo.

-A tão sonhada Revolução Energética que entre suas “conquistas” tinha a de impedir este tipo de monumentais cortes elétricos, voltou a demonstrar seu fracasso. Até o emblemático Morro da baía de Havana perdeu a luz do seu farol, que alguns ironicamente associaram com aquela piada: “o último a sair apague o Morro…”

-Mais da metade das pessoas que me chamou alarmadas durante o tempo de escuridão, associava o sucedido com algum problema de governo. Frases no estilo ““ isto caiu “…” Repetiam-se por todos os lados. A desinformação dos meios tornava essa sensação mais forte. O que indica o estado de fragilidade política e social de uma nação onde um apagão de várias horas pode levar seus cidadãos a pensar que todo um sistema desabou. Significativo. Não é verdade?

-Alguém comentou que o General Presidente “estava pedindo sangue” aos diretores do Ministério da Indústria Básica… Limitei-me a responder: melhor que peça eletricidade, pois é muito fácil exigir responsabilidades dos outros quando todos sabem quem toma as principais decisões energéticas da nação.

-Depois de um longo silêncio, a meia noite, a televisão leu uma curta nota tão crítica que gerou, ainda sim, mais especulações. Atribuíam o fato a um rompimento na linha de 220.000 volts perto de Ciego de Ávila. Até agora não acrescentaram novos detalhes.

-Pouco a pouco, durante a madrugada, restabeleceu-se o fluxo elétrico na capital e na maioria das outras regiões afetadas. Não há informes de danos ocasionados, ainda que, com certeza, deva haver muitíssimos.

-No final ficamos com a convicção de que o país está numa precariedade material que qualquer incidente deste tipo pode voltar a acontecer. E, o pior, os meios nacionais manterão seu habitual secretismo.


Tradução Humberto Sisley de Souza Neto
*Acrescentamos subtítulo, foto e legenda a publicação original

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