26 de jun. de 2012

Conselho de Ética pede cassação do senador Demóstenes Torres

BRASIL - Corrupçao
Conselho de Ética pede cassação do senador Demóstenes Torres
O senador Humberto Costa (PT-PE) teve aprovado por unanimidade o relatório lido no plenário da Comissão de Ética do Senado, na noite desta segunda-feira, onde pedia a cassação do mandato do senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO). O processo, porém, só será concluído com a votação no plenário do Senado. Demóstenes só perderá o mandato se 41 dos 80 senadores votantes (ele estará impedido de votar) decidirem por sua cassação. A expectativa é que o processo todo seja concluído até o dia 17 de julho, último dia de trabalho no Senado antes do recesso de meio de ano. Senão ele só será apreciado em agosto, rivalizando com o julgamento do mensalão no STF

Foto: José Cruz/Agência Brasil

"A vida política do senador Demóstenes, desde 1999, gravita em torno dos interesses de Carlinhos Cachoeira no ramo de jogos de azar", disse Humberto no seu relatório

Postado por Toinho de Passira
Fontes: UOL, Folha Online, G1, Congresso em Foco, Correio do Brasil, Agência Senado, Agência Senado

Os integrantes do Conselho de Ética do Senado aprovaram, por unanimidade o relatório do senador Humberto Costa (PT-PE), que pediu a cassação do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) por quebra de decoro parlamentar.

No seu relatório Humberto diz que o líder o ex-líder do DEM recebeu "vantagens indevidas" do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e praticou "irregularidades graves" em seu mandato.

Cachoeira foi preso em fevereiro, durante a Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, sob a acusação de explorar o jogo ilegal e por corrupção ativa.

Com a aprovação, o processo contra Demóstenes segue para votação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado. Em seguida, vai ao plenário. Para que Demóstenes perca o mandato em definitivo, o pedido de cassação tem que ser aprovado por pelo menos 41 senadores no plenário em votação secreta.

RELATÓRIO

A leitura do relatório de Costa durou três horas. Em 79 páginas, o relator afirma que Demóstenes agia como uma espécie de "despachante de luxo" do empresário ao defender seus interesses em órgãos do governo - como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Ministério da Educação e Receita Federal.

No seu voto, Humberto Costa afirmou que o senador goiano cometeu vários crimes para favorecer interesses de Carlinhos Cachoeira, como advocacia administrativa, formação de quadrilha, favorecimento pessoal e favorecimento real.

- Afirmo, sem tergiversar, que o senador Demóstenes Torres teve um comportamento incompatível com o decoro parlamentar - disse o relator ao final.

Humberto Costa rebate alegações da defesa de Demóstenes, expõe contradições entre o que disse o senador e o que apontam as escutas da Operação Monte Carlo, que prendeu Cachoeira, acusado de comandar uma organização criminosa. O relator trata, ainda, do recebimento de vantagens ilícitas e do envolvimento de Demóstenes com a lavagem de dinheiro do empresário, com sua logística de proteção, e com o uso da imprensa.

- Considerado todo o conjunto da obra, é impossível não concluir que ela o desabona. Quem o julga somos nós; mas é o seu passado que o condena - declarou.

Humberto Costa rebateu as alegações da defesa sobre a ilegalidade das escutas da Operação Monte Carlo, o que impediria o conselho de usá-las para embasar o relatório. Para ele, esse é um aspecto que deve ser levado em conta pela justiça e não pelo Conselho de Ética, em que o juízo a ser emitido é eminentemente político.

Foto: Frame/Folhapress

Para Carlinhos Cachoeira o senador Demostenes era o “braço político”, o “facilitador institucional que poderia auxiliar na manutenção e na satisfação dos seus interesses”- segundo relatório de Humberto

BRAÇO POLÍTICO

No relatório, Humberto Costa conclui que a vida política do senador Demóstenes, desde 1999, gravita em torno dos interesses de Carlinhos Cachoeira Na exploração de jogos de azar. O papel do senador não seria operacional, mas sim de “braço político”, facilitador institucional que poderia auxiliar na manutenção e na satisfação dos interesses de Cachoeira.

Para o relator, o envolvimento entre o senador e o empresário é notório, assim como o fato de as relações não se limitarem ao campo social. Ele lembrou que, em 316 dias, foram registradas pela polícia 416 conversas telefônicas entre Demóstenes e Carlinhos Cachoeira. Além disso, o senador teria mantido 25 conversas com pessoas apontadas como membros da organização. E Demóstenes teria sido citado em outras 315 conversas.

Para o relator, Demóstenes “se deixou instrumentalizar por Cachoeira”, que se valeu do prestígio do senador para fazer prevalecer seus interesses.

- Estamos diante de um mandato parlamentar corrompido.

DESPACHANTE DE LUXO

O relator cita diversas situações em que Demóstenes teria atuado em favor dos interesses de Cachoeira em órgãos como Anvisa, Ibama, Infraero, Dnit e Ministério da Educação, além de governos estaduais e prefeituras. É nesse contexto, afirma o relator, que Demóstenes teria cometido o crime de advocacia administrativa.

- Nas conversas telefônicas interceptadas há, à saciedade, diálogos que tratam de “jeitinhos” em despachos alfandegários ou “negócios” na tramitação de processos administrativos tributários - lembrou o relator.

Humberto Costa citou a atuação de Demóstenes, admitida pelo próprio, em favor da empresa farmacêutica Vitapan, com sede em Anápolis. A Vitapan é uma sociedade de Cachoeira com seu ex-cunhado, Adriano Aprígio de Souza e sua ex-mulher, Andréa Aprígio de Souza.

No Ministério da Educação, o senador teria buscado autorização para o Instituto Nova Educação, do qual é sócio, e para uma escola de medicina vinculada à Faculdade Padrão, que pertence a Walter Paulo Santiago. Santiago é o dono da casa em que Cachoeira foi preso em fevereiro.

O relatório também cita a atuação de Demóstenes na assistência a policiais presos em operação que investigava o envolvimento deles com grupos de extermínio em Goiás.

- O representado estava ciente, acompanhou de perto os acontecimentos e, na hipótese que lhe seria mais vantajosa, explorou seu prestígio.

Foto: José Cruz/Agência Brasil

“Até as pedras de Pirenópolis e as capistranas de Goiás Velho sabiam disso. Não é crível que um Secretário de Segurança Pública, que antes fora, por duas vezes, o chefe do Ministério Público Estadual, desconhecesse a ficha corrida de seu interlocutor” (Carlinhos Cachoeira) – diz Humberto Costas no seu relatório

QUADRILHA

O relatório também cita o uso, por parte de Demóstenes, de telefone celular Nextel com contas pagas por Cachoeira, Para Humberto Costa, não interessa o valor das contas e sim o fato de ela ser paga pelo empresário.

- Como se verdadeiramente estivesse em questão o valor do aparelho, ou o valor das faturas mensais e não o caráter de uma relação com um empresário, melhor dizendo, um meliante, que cobria as despesas de um senador da República.

Para o relator, os celulares, usados também por outros integrantes da organização, eram “uma peça na engenharia do crime organizado, uma rede fechada de comunicação utilizada para a prática de crimes”. O uso dos aparelhos, segundo o senador, é elemento importante para apuração da prática de crime de formação de quadrilha.

O relatório também menciona trechos das gravações que apontam para o recebimento de dinheiro por Demóstenes e traz a afirmação de que as contribuições de Cachoeira para a campanha do senador seguem o padrão de caixa dois. O fato de não haver nas prestações de contas perante a Justiça Eleitoral vestígio de contribuições de Cachoeira desde 2002, se deveria ao fato de o grupo se esforçar para “não deixar a digital em nada”.

Foto: Roosewelt Pinheiro /Agência Brasil
Segundo Humberto Costa, , Demóstenes “se deixou instrumentalizar por Cachoeira”, que se valeu do prestígio do senador para fazer prevalecer seus interesses.
CONTRADIÇÕES

Em seu depoimento ao Conselho em maio, Demóstenes afirmou ter conhecido Cachoeira na época em que era Secretário de Segurança Pública do Estado de Goiás, na gestão do Governador Marconi Perillo. Segundo Humberto Costa, não é crível que um Secretário de Segurança Pública, que já havia sido promotor, desconhecesse as atividades de Cachoeira.

Humberto Costa também lembrou o fato de Demóstenes ter dito ao conselho que não se lembrava de ter participado da CPI dos Bingos, iniciada em 2005 com base em uma gravação feita por Cachoeira, “empresário do setor de jogos”.

Humberto Costa lembrou que Demóstenes foi um dos responsáveis pela criação da CPI, além de ter participado como “implacável inquisidor”.

- Mas o Senador Demóstenes Torres não guarda memória alguma desses eventos - ironizou o relator, para quem Demóstenes “foi tomado por súbita amnésia” em relação a fatos recentes da vida nacional.

Segundo o relator, a postura de Demóstenes na CPI dos bingos mudou quando a comissão investigou as questões pertinentes a Cachoeira.

- O senador Demóstenes Torres adotou postura distinta da que usava para atacar autoridades públicas: recolheu-se, acautelou-se.

Humberto Costa também citou gravações telefônicas que apontam para o conhecimento de Demóstenes sobre as atividades do amigo, como quando, ao tratar de projeto de lei que tornaria crime a exploração de jogos de azar exercida, teria dito a Cachoeira: “isso te pega”.

O interesse de Demóstenes pelo tema da legalização dos jogos de azar, segundo Humberto Costa, vem desde o início de seu mandato, em 2003. O relator lembrou que, em julho daquele ano, o senador mencionou em plenário, sem citar a fonte, futuros investimentos do setor de cassinos no Brasil. Além disso, demonstrou conhecimentos sobre o setor de apostas pela internet, em que Cachoeira avançava.

Foto: José Cruz/Agência Brasil

O advogado de Demóstenes, Antonio de Almeida Castro, o Kakay, disse que o senador foi alvo de um "massacre"

DEFESA

Na sessão, o advogado de Demóstenes, Antonio de Almeida Castro, o Kakay, disse que o senador foi alvo de um "massacre" e de "vazamento criminoso" das gravações da PF que apontaram uma ligação entre o parlamentar. "Os vazamentos foram um massacre à pessoa de um senador. [...] O vazamento foi criminoso, covarde e foi direcionado", disse Kakay durante o tempo que teve para defender o senador.

Kakay reconheceu que o julgamento no Conselho de Ética é "político", mas lembrou que questionou no Supremo Tribunal Federal (STF) a legalidade das escutas da PF. Ele argumenta que, como tem foro privilegiado, a escuta deveria ter sido autorizada no STF e não pela primeira instância da Justiça Federal, como ocorreu.

"Esse julgamento é político. A decisão é política. Vossas excelências não têm nem mesmo que fundamentar seu voto. Mas o processo há que seguir a Constituição, a resolução."

O advogado de Demóstenes ainda desafiou os membros do Conselho a aprovar algum tipo de sanção ao senador -- que vai de advertência à cassação. Ele pediu que o processo disciplinar que apura as relações do bicheiro com o senador vá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e que, em seguida, seja votado pelos senadores no plenário.

"O senador quer ser julgado pela totalidade do Senado federal. Sendo ele um senador eleito de forma absolutamente consagradora em seu estado. [...] O senador entende que deve ir ao plenário. A defesa técnica pede que vossas senhorias encaminhem o processo para o plenário, para que ele decida a sorte desse senador da República."

VOTO SECRETO


Após a apresentação do relatório, o senador Mário Couto (PSDB-PA) criticou a fala do advogado de Demóstenes, que pediu que o caso Demóstenes seja encaminhado para o plenário do Senado, onde a votação do processo será secreta. Ele defendeu o voto aberto.

O último senador a ter a cassação aprovada pelo Conselho de Ética foi Renan Calheiros (PMDB-AL), em 2007, após acusação de ter recebido recursos de uma construtora para pagar despesas pessoais da jornalista Mônica Veloso, com quem tem uma filha. O plenário do Senado, no entanto, rejeitou a cassação.


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