6 de set. de 2010

REVISTA VEJA: O estado a serviço do partido

REVISTA VEJA
O estado a serviço do partido
Violação do sigilo fiscal da filha de José Serra levanta suspeitas sobre o envolvimento do governo e mostra o enfraquecimento das instituições na era Lula.

Fotomontagem Toinho de Passira

Até onde o leão da Receita é petista?

Fonte: Revista VEJA 06/09/2010

A empresária Verônica Serra, filha do candidato à Presidência da República José Serra, é conhecida pela discrição. Casada, mãe de três filhos, ela nunca se envolveu em política, tem aversão a palanques, mas, na semana passada, foi alçada à condição de personagem principal de uma escabrosa história de bandidagem politico-institucional.

Soube-se que, em setembro do ano passado, à sombra da lei e cumprindo uma missão bem definida, um grupo de bandoleiros acessou ilegalmente suas últimas declarações de imposto de renda na Delegacia da Receita Federal em Santo André, no ABC paulista, e saiu de lá com cópias dos documentos.

Como qualquer contribuinte, Verônica Serra coloca à disposição do estado brasileiro informações sobre seus bens, as despesas médicas dela e da família, as anuidades das escolas dos filhos, o saldo bancário, seus números telefônicos, enfim, dados absolutamente sigilosos que, pela Constituição, só deveriam ser compartilhados entre ela e o Fisco.

Depois de violados, os documentos obtidos em Santo André percorreram mais de 1.000 quilômetros, até chegar a uma mansão em Brasília onde funciona um dos comitês de campanha da candidata petista Dilma Rousseff - naquele que, apesar da gravidade, é apenas o episódio mais recente do continuo processo de agressão aos direitos individuais e aos princípios elementares da democracia.

Para entender as implicações da trama que resultou na invasão de privacidade da filha do candidato José Serra, é preciso recuar no tempo. Em setembro de 2009, o PT se preparava havia meses para lançar a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, como candidata à Presidência da República.

Desconhecida da maioria dos brasileiros, a petista estava muito distante da popularidade de hoje, era suspeita de mandar bisbilhotar os gastos da Presidência durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso, enfrentava acusações de ter interferido em uma investigação da Receita Federal em benefício da família Sarney e ainda contornava as dificuldades para costurar os acordos políticos com o PMDB.

Enquanto isso, seu principal adversário, o tucano José Serra, aparecia como franco favorito em todas as pesquisas de intenção de voto. No fim daquele mês, usando uma procuração falsa, um contador de São Paulo violou o sigilo fiscal de Verônica Serra. A pedido de quem? O contador Antônio Carlos Atella atribui a encomenda a Ademir Estevam Cabral, um contador filiado ao PV.

Atella, descobriu-se na última sexta-feira, é petista de carteirinha. Em 20 de outubro de 2003, no primeiro ano do governo Lula, a seção paulista do PT encaminhou à Justiça Eleitoral uma comunicação de filiação com o nome dele.

Sempre que uma pessoa ingressa em um partido, a agremiação é obrigada a informar esse vínculo à Justiça. Quando Atella se tomou um militante petista, ele vivia em Mauá, no ABC paulista. Era lá que estava registrado seu título de eleitor. Depois, ele alterou seu domicílio eleitoral para a vizinha Ribeirão Pires.

Em 21 de novembro do ano passado, o nome de Atella foi retirado da base de dados da Justiça Eleitoral. Ainda não está claro por que ele sumiu do sistema. A hipótese mais provável - entre as republicanas, é lógico - é que o Tribunal Superior Eleitoral tenha encontrado alguma divergência em seus dados cadastrais.

O que não seria surpresa no caso de alguém que troca de CPF com a mesma leveza de alma que viola declarações de imposto de renda. Isso não quer dizer, no entanto, que ele tenha se desfiliado do PT.

Dez dias depois da quebra de sigilo de Verônica Serra, mais cinco pessoas ligadas ao PSDB e a José Serra, entre elas o vice-presidente do partido, Eduardo Jorge, tiveram suas informações fiscais acessadas clandestinamente, em uma unidade da Receita de Mauá, com o uso de senhas e computadores dos próprios funcionários do Fisco.

Além da coincidência de datas, os casos têm outro ponto em comum: os dados também foram enviados a Brasília, ao comitê de campanha de Dilma Rousseff.

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