11 de dez. de 2009

OPINIÃO: Sarney, não é um corrupto qualquer

OPINIÃO
Sarney, não é um corrupto qualquer
O presidente do senado teoriza e pratica a corrupção com a desenvoltura de um grande mestre. Indigna-se com a vulgarização da corrupção ativada por semi-amadores descuidados. Corrupção para ele é uma arte, uma razão de ser, um estilo de vida

Photoshop Toinho de Passira

O presidente do senado, José Sarney não se “furta” em dá sabias lições de corrupção as gerações futuras

Fontes: Folha de São Paulo, Jornal Pequeno, Blog do Jamildo

No seu artigo semanal para a Folha de São Paulo, da semana passada, o presidente do senado José Sarney surpreende o leitor, constatando que a corrupção brasileira é uma espécie de doença que está se propagando, como se fosse uma novidade e não houvesse a sua diligente participação.

Diz em certo momento: "Ultimamente, os escândalos de corrupção têm marcado a vida pública brasileira. São episódios vergonhosos, que denigrem cada vez mais os políticos. Se a corrupção é um câncer para a sociedade, muito mais quando se trata da corrupção política".

Noutro, mostra-se ainda mais indignado: "O que ocorre no país neste instante é inclassificável. É trágico, deprimente, inconcebível, sob todos os ângulos".

Costuma-se dizer que em casa de enforcado não se fala de corda, mas para o presidente do senado, José Sarney, falar de corrupção não lhe embaraça, sob nenhum ângulo. Tanto teoriza com desenvoltura sobre o tema, como se indigna como um puro.

Imaginamos que parte da indignação é pelos fatos recentes, do envolvimento do governador do Distrito Federal, José Arruda e seus panetones distritais, como alguém que estivesse, por amadorismo ou descaso, desmoralizando a própria corrupção.

Por pouco Sarney não chegou pedir que se respeitasse a corrupção. Que corruptos são esses que recebem pessoalmente e em espécie, deixam-se filmar e não tem uma explicação decente para o inexplicável?

Na condição de corrupto bem sucedido e magnâmico, dá-se ao luxo de ao final, retirar do corrupto político, parte da culpa pela corrupção, numa espécie de corporativismo de corruptos.

Explica para os leigos que sem dinheiro ninguém chega à vitória eleitoral, e que de nada servem os ideais, os programas e os princípios, só há salvação e êxito na corrupção do caixa dois, das doações secretas. Poupa os corruptos da forca e conclui com soberania que o grande culpado pela corrupção política brasileira é o sistema eleitoral.

Se você não acreditar na gente, e pensar que não foi assim, veja na o artigo transcrito abaixo, uma reprodução fiel do publicado na Folha de São Paulo.

A pandemia da corrupção
José Sarney

Na história da humanidade e da civilização, jamais foi encontrado antídoto algum contra a corrupção. Já o Código de Hamurabi, que data de 1700 a.C., durante muito tempo considerado o primeiro código legal da humanidade, fala em punição de governantes corruptos.

Cícero e Catão construíram suas histórias políticas martelando contra ela, e em todos os parlamentos existem grupos ou pessoas que fazem sua carreira defendendo a pureza das instituições a que pertencem ou atacando a dignidade de seus colegas.

As ideias políticas do mundo ocidental incorporaram o combate à corrupção e, mais do que isso, a acusação aos adversários de corruptos como chaves da atividade política.

Adriano Moreira, um grande mestre da ciência política em Portugal, anota com agudeza que o discurso de Péricles aos mortos da Guerra do Peloponeso já inclui as duas coisas: primeiro, a condenação da corrupção; depois, a acusação do adversário de corrupto quando fala do roubo de ouro das estátuas de Fídias, a quem defende.

Ultimamente, os escândalos de corrupção têm marcado a vida pública brasileira. São episódios vergonhosos, que denigrem cada vez mais os políticos. Se a corrupção é um câncer para a sociedade, muito mais quando se trata da corrupção política, definida como "o uso ilegal do poder político e financeiro com objetivo de transferir renda pública ou privada de maneira criminosa para indivíduos ou grupos".

Muitas leis, barreiras, ameaças, punições têm tentado evitá-las. Nossa primeira lei contra a corrupção de colarinho branco foi feita por mim (lei 7.492/86). É de minha autoria a lei que determina a declaração de bens de candidatos a cargos públicos.

Mas nada disso pode deter a doença que ataca a classe política. Nabuco, no discurso em que defende João Alfredo -o presidente do Conselho que fez a Lei Áurea-, dizia o quanto ela era uma constante da nossa história e citava casos, como o das concessões para loterias, engenhos centrais e outras. Mas, comparadas com as de hoje, são quase que pecadilhos angelicais.

O que ocorre no país neste instante é inclassificável. É trágico, deprimente, inconcebível, sob todos os ângulos. Mas acredito que o grande responsável por tudo isso esteja passando incólume.

É o nosso sistema eleitoral. O voto uninominal proporcional, que destrói a democracia, os partidos, a vida pública e a própria classe política. Para a eleição, os ideais, os programas e os princípios de nada servem. Só o dinheiro necessário para a vitória. E o país pensa que enforcar os corruptos resolve tudo. Quem deve ser enforcado é o sistema eleitoral. Sem isso, de nada adianta punir ou envergonhar-se.


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