3 de ago. de 2009

O gás dos Sarneys

O gás dos Sarneys
Através de grilagem explicitas a família Sarney ganhou um poço de gás no Maranhão

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
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Fonte: Revista Veja

A família Sarney sempre teve um apreço especial pelo setor energético, feudo do clã há pelo menos duas décadas. Além de dividendos políticos, o controle do setor proporciona outras vantagens. A Fundação José Sarney, criada pelo senador no Maranhão, é acusada de desviar dinheiro de um convênio com a Petrobras.

O Instituto Mirante, ONG presidida pelo filho-problema Fernando Sarney, recebeu recursos da Eletrobrás para financiar projetos culturais no estado – parte desviada para contas de empresas da família.

Fernando Sarney é o mesmo empresário que fez bons negócios na década de 80 vendendo postes de luz à estatal de energia do Maranhão ao mesmo tempo em que presidia a empresa por indicação do pai.

A incursão mais recente e enrolada dos Sarney no campo energético ocorreu em Santo Amaro, no interior do estado. Lá, a Petrobras descobriu um manancial de gás natural. Há três anos, com a valorização do gás no mercado internacional, a Agência Nacional do Petróleo decidiu licitar a área para exploração.

Antes que isso acontecesse, porém, o senador José Sarney tomou posse do local. Tomou posse, explique-se, porque há indícios de que houve grilagem de terras e estelionato – tudo coincidentemente conjugado com decisões de órgãos federais do setor energético comandados por pessoas ligadas a Sarney.

Fotos: Ana Araújo e Celso Junior/AE

O IMPÉRIO SOB INVESTIGAÇÃO - Vista aérea do Convento das Mercês (à dir.), sede do Memorial José Sarney, em São Luís, e o poço de gás – a válvula em terras do grupo na região dos Lençós Maranhenses (à esq.). A situação se agravou com as revelações sobre desvio de dinheiro público, tráfico de influência e grilagem de terras

Oficialmente, as áreas onde ficam os reservatórios de gás pertencem à empresa Adpart, que tem o presidente do Senado como cotista. O problema é que existem enormes discrepâncias entre o que dizem os papéis da empresa de Sarney e o que indicam as certidões dos imóveis. O que se media em poucos metros nas certidões dos cartórios do Maranhão passou a se contar em centenas de hectares nos documentos de Brasília.

O milagre da multiplicação é que permitiu ao senador se tornar proprietário da área minada de gás. Numa certidão, Sarney diz ter comprado 200 hectares do lavrador Clodoaldo Garcia Lira. Entrevistado por VEJA, porém, o lavrador disse que vendera somente um "pedacinho" pequeno de terra, onde cultivava caju e mandioca. Ele diz ter vendido o terreno por 25.000 reais, pagos em dinheiro vivo por Ronald Sarney, irmão do presidente do Senado e procurador dele nos negócios de Santo Amaro.

Diz o lavrador: "Meu terreninho ficava a uns 10 metros do poço". Depois da venda, o poço apareceu misteriosamente dentro do terreno. "Foi o pessoal do Sarney que cercou", diz o lavrador.

O principal poço de gás localizado nas terras também está cercado por arames e madeira. Entrevistado, o capataz de Sarney, José Ribamar Rodrigues de Oliveira, diz ter feito o serviço: "O doutor Ronald (irmão de Sarney) que me pediu. O presidente Sarney já veio aqui três vezes visitar o poço. Isso aqui tudo é do Sarney". Será?

Em fevereiro de 2006, o então ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, indicado por Sarney para o cargo, autorizou a Agência Nacional do Petróleo a licitar a área. A Panergy, empresa que ganhou a licitação, pagou 1,1 milhão de reais ao governo pelo direito de investir na região.

A empresa só aguarda a anuência ambiental do Instituto Chico Mendes para começar a exploração. Diz Normando Paes, dono da Panergy: "Trata-se de um campo de gás e não esperamos problemas para explorar. Fui informado pelo governo de que a área é pública e pertence ao estado do Maranhão".

Telma Thomé, presidente da estatal de gás do Maranhão durante o processo de licitação da ANP, confirma que a área é pública. "As terras são do estado do Maranhão. Nós sempre trabalhamos os projetos de exploração de gás com essa perspectiva", diz ela.

O cartório da cidade não ajuda a esclarecer o mistério. Diz a tabeliã Elke Viviane: "O pessoal do Sarney trouxe a certidão de compra das terras. Não posso falar mais nada". Nem precisa.


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