10 de ago. de 2009

Elle, o de sempre

Elle, o de sempre
Roberto Pompeu de Toledo

Ilustração Pojucan/Estadão

"Quando Collor se cansou de Simon e de Sarney, sobrou
para quem? O colunista que vos fala. O que disse é mentira.
Mais uma vez: MENTIRA. E uma terceira: MEN-TI-RA"

Fonte: Revista VEJA

Pode sentir-se defendido quem tem em sua defesa a dupla formada pelos senadores Renan Calheiros e Fernando Collor de Mello? Há defesas que ferem como ataque. Num primeiro momento funcionam, como funcionou a furibunda blitz desfechada pela dupla contra o senador Pedro Simon, na memorável sessão do Senado da última segunda-feira. A torrente de insultos, insinua-ções e, da parte de Collor, assustadoras caretas lançadas contra Simon intimidou o senador gaúcho a ponto de, como ele afirmaria mais tarde, ter sentido medo físico. Mas o ônus de carregar pela vida afora, e biografia adentro, o fato de ter contado com tais defensores supera o alívio momentâneo. Os senadores do PT sabem disso e conspicuamente procuram se dissociar dos referidos senhores. Já o presidente do Senado, José Sarney, não bastassem os próprios problemas, é refém de um duo cujo abraço aperta, aprisiona e sufoca como tenaz.

O senador Collor superou-se, naquele dia, na utilização dos velhos recursos em favor do novo papel de injustiçado e sofredor. Buscando inspiração no aparelho digestivo, ordenou a Simon que "engolisse" as próprias palavras e "as digerisse como julgasse conveniente". Chamou o honrado senador de "parlapatão". E enquanto isso armava seu impressionante repertório de expressões fisionômicas e exalações corporais, um conjunto que, querendo sublinhar indignação, acaba por revelar um perturbador descontrole. A respiração era pesada como a do touro ao investir contra o pano vermelho. Repetiam-se os estranhos olhos fixos de outras ocasiões. E a alturas tantas, quando se cansou de Simon e de Sarney, sobrou para quem? Quem? Quem? O colunista que vos fala.

Disse ele que "o jornalista chamado Roberto Pompeu de Toledo, que costuma sujar a última página de uma revista local, se não me engano a VEJA", procurou o ministro Ilmar Galvão, encarregado, no Supremo Tribunal Federal, de relatar o processo contra ele, Collor, à época do impeachment, e lhe propôs: "Ministro, declare a culpa do Fernando Collor que nós daremos ao senhor a capa e as entrevistas de páginas amarelas da revista". O ministro, indignado, teria expulsado o interlocutor de seu gabinete.

Deus do céu, quanta pretensão, num pobre jornalista, achar que a efêmera glória do bom tratamento num órgão de imprensa pudesse influenciar o julgamento de um ministro do Supremo! Collor acrescentou que Roberto Pompeu de Toledo não poderia desmentir tal episódio. Pode sim. É mentira. Mais uma vez: MENTIRA. E uma terceira: MEN-TI-RA. A conversa que na época o colunista teve com Ilmar Galvão não teve nunca, jamais e em tempo algum o caráter de (ingênua) negociação do julgamento do ministro contra possível tratamento privilegiado em VEJA.

Mesmo se, enlouquecido, o jornalista quisesse fazê-lo, não teria poderes, como não tem agora, nem nunca teve, de dispor da capa ou das páginas amarelas da revista. Seu único e singelo objetivo era informar-se. Claro está que se não houve o principal – uma tentativa de negociação – também não houve o secundário – a expulsão do gabinete. Em todo caso, registre-se que o cinematográfico desfecho pretendido pelo senador é outra mentira, MENTIRA, MEN-TI-RA. A entrevista transcorreu em clima de cordialidade.

Como encerrar este artigo? Primeira hipótese: dizer que sujar páginas por sujar páginas, perito mesmo na especialidade é o ex-presidente – no caso, sujar as páginas da história do Brasil. Sentencioso demais. Se os leitores permitem a falta de modéstia, o colunista gostaria na verdade é de congratular-se consigo mesmo. Ao contrário de Sarney, ele não tem Collor como defensor. Tem como acusador. É uma honra.


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